quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Do Outro Lado do Corredor

O filme, uma comédia de segunda categoria com atores de quinta, estava na metade quando Augusto levantou-se do sofá para pegar mais uma cerveja na geladeira. Teve a decência de perguntar a Amaral, o dono da casa, se ele iria querer uma também. Só não fez a mesma pergunta para Peixoto, que cochilava no sofá com os pés sobre a mesinha de centro, repleta de latas de cerveja e refrigerante.

— Pega também uns amendoins no armário.

A cozinha era o local mais organizado da casa. Amaral convidara alguns amigos da faculdade para umas de suas muitas festas de sábado. Em geral envolviam bastante cerveja, conversas idiotas, um jogo de cartas e algumas beldades da faculdade. Infelizmente as meninas bonitas estavam escasseando, provavelmente indo a lugares mais interessantes, e as festas de Amaral começavam a parecer mais com uma combinação entre barbearia e boteco. As poucas meninas que haviam comparecido estavam com seus namorados. Lá pelas 23h, quando a festa deveria estar começando, os convidados começaram a pegar o rumo de suas casas.

Bom, pelo menos ainda havia bastante cerveja na geladeira.


Enquanto procurava o bendito saco de amendoins no armário, ouviu um barulho no corredor do prédio. Uma risadinha de mulher. Como estava perto da porta de serviço, espiou pelo olho mágico. Conseguiu ver as escadas do prédio e a porta do apartamento em frente. Estava parcialmente aberta e lá dentro tudo estava escuro. Ficou olhando por mais alguns segundos, curioso para ver a dona da risada. Teve a impressão de ver algo se mover lá dentro e de ouvir o som de algo sendo arrastado. A porta do vizinho se abriu um pouco e depois se fechou com um baque.


Por um breve momento, teve a impressão de também estar sendo observado.

Pegou as latas que estavam sobre a pia e voltou para a sala.

— Prédio sossegado esse seu — disse entregando a lata para Amaral — Sabe se tem algum apartamento para alugar?

— Acho que uns dois ou três.  O aluguel daqui é meio caro... E ainda tem o condomínio. Se não fosse o Peixoto pra rachar o valor eu ainda estaria na casa dos meus pais... Mas nem é tanto pelo aluguel que eles continuam vazios... Pelo menos eu acho.

O filme estava quase no fim quando terminaram suas cervejas. Amaral arrotou alto o suficiente para perturbar o sono de Peixoto, que resmungou e se mexeu um pouco.

— Não é melhor acordar o coitado e mandá-lo para a cama?

— Eu não sou esposa dele. Ele que durma aí. Contanto que não ronque...

Amaral começou a pular de um canal para o outro. Augusto não estava com a menor vontade de ir para casa. Não tinha cerveja lá. Torceu para que o amigo achasse um filme menos pior que o último.

Dessa vez Amaral foi até a cozinha e voltou com quatro cervejas e um saco de batatas.

— Você falou que não era tanto pelo aluguel... Qual o problema então?

— Uma coisa que o porteiro me contou. Contei a história pro Peixoto... Cara, você precisava ver. Ele ficou uns dois dias dormindo com a luz do quarto dele acesa.

— Sério?

— Acredita nisso? Um futuro matemático...

— E o que foi que ele contou?

Amaral acabou sua cerveja e abriu a outra.

— Uma dona aqui do prédio ficou louca. Matou o marido envenenado. Ela era professora aposentada e o marido era protético... Desses caras que fazem dentaduras. Acharam estranho quando o cara sumiu da firma e ela sempre dava uma desculpa quando procuravam por ele.

Encheu a boca de batatas fritas, ajudando-as a descer com mais um gole de cerveja.

— Os vizinhos achavam que ele estava em casa porque ouviam a tal dona rindo e conversando. Parece que ele nunca foi de falar muito, então ninguém estranhava ouvir só a voz dela. Que combinação... tagarela e assassina...

— ... E maluca.

— Escuta só o final. Começaram a sentir um fedor pelo prédio todo coisa de um mês depois dele sumir. Até que um vizinho do prédio que ficava de frente pra eles chamou a polícia. O cadáver do cara estava na cama deles e o coitado viu o defunto pela janela. Quando a polícia bateu na porta dela, ela tomou o mesmo veneno que tinha dado para o marido.

Augusto assobiou admirado.

— Que coisa bizarra... Mas não parece o suficiente pra tirar o sono de alguém... Não sabia que o Peixoto era tão frouxo assim. Tem muito tempo isso?

— Uns cinco anos. Abafaram muito do caso. Eles eram um casal normal e querido até ela surtar. Mas os moradores dos prédios vizinhos sabem da história toda... E toda vez que alguém vem para ver um apartamento, acabam soltando alguma coisa.

— Bom, se for só por isso... — Augusto tomou um gole da sua cerveja, amassando a lata. Abriu a próxima, mas ficou só segurando a lata, sem beber. Sentira a cabeça girar um pouco. Era melhor evitar exagerar ou corria o risco de errar o caminho para casa. — E em qual apartamento foi isso?

— O daí da frente. Nosso vizinho. Até hoje não conseguiram alugar... O Joel, o porteiro, disse que o cheiro do coroa ficou impregnado lá dentro. E também falou que toda semana alguém reclama de barulhos lá. Coisas raspando no chão, pancadas na parede, coisas sendo arrastadas... Teve uma que interfonou pra portaria no meio da noite reclamando de risadas lá dentro. Claro que ele nem se coçou. Sabe como são as pessoas... Adoram acreditar nas coisas que imaginam. Eu acho que tudo não passa de ratos e pessoas que se impressionam a toa... O lugar está vazio desde antes de nos mudarmos.

Augusto ficou segurando a cerveja e sentindo os dedos adormecidos. Não era pelo frio da lata. Era puro e simples medo.

— Quer mais uma cerveja? — perguntou Amaral.

Augusto queria. Decidiu beber o máximo que pudesse e esperar o dia raiar para voltar para casa. Não queria correr o risco de que a porta abrisse no momento em que ele estivesse esperando o elevador.


Nem queria imaginar o que poderia estar dentro daquele apartamento, logo ali, do outro lado do corredor.


Enviado por: Hedjan C.S. do blog material de pesadelos

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Restos

 Quando andarem nas ruas, vocês irão encontrar os meus restos. Jogado no esgoto estará meu sangue. Minha cabeça talvez no lixo. Mas antes disso, enviarei meus dedos pelo correio. Cada dedo pra uma pessoa que eu amo.
 Se alguém um dia ler isso, peço por favor que alimente o meu gato com meu fígado. Um pedaço pequeno por dia. 
O resto do corpo estará enterrado no quintal da casa. Faça o que quiser com ele. 

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Estrelinha: o demônio lagarto

Já era fim de tarde quando aquelas lavadeiras à beira do rio Carangola paravam com a cantoria, e já se preparavam para retornarem para as suas palhoças. E com suas bacias cheias de roupa, além das próprias roupas que vestiam estarem todas ensopadas, elas se despedem de Galega, a única que prefere ficar por ali, devido ao acúmulo de roupas que a mesma havia juntado. As amigas se espantam e também a advertem que já estava escurecendo, e que não só algum bicho do mato, mas também por ser Quaresma, como a crendice daquele lugarejo acreditava, alguma assombração ou algo parecido, poderia surgir e atacá-la. Mas trabalhadeira e rústica como era, Galega que nem católica mais era, esta debochava da crendice das amigas e demonstrando total desdém, desfaz de sua antiga religião e exalta o pastor de sua igrejinha que em muitas de suas pregações, também condenava os folclores e as crendices populares locais. As amigas vendo a convicção de Galega, não vêem outro jeito a não ser deixá-la ali sozinha com suas roupas à beira daquele rio amarelo que devido a escuridão que já tomava aquela mata, se enegrecia e já se permitia refletir a imensa lua cheia que já despontava naquele céu sertanejo. 'A saia da Carolina tem um 'largato' pintado/ A saia da Carolina tem um 'largato' pintado...sim Carolina ô-i-ô-ai/sim Carolina ô-ai meu bem...Debruçada com suas ancas avantajadas, aquela jovem tabaroa cantava sozinha essa música que lhe fora ensinada por sua avó descendente direta de portugueses. Mas agora ela cantarolava num tom mais baixo e tímido, devido a solidão ou por um certo e ligeiro medo que já começava a lhe tomar. Até que sua cantoria é interrompida por uma moita que começa a se mexer. E assim, Galega logo se espanta, e ao parar de lavar suas roupas, olha ao redor para ver quem ou 'o que' era. Mas para sua surpresa e até graça, ela vê que se tratava de um lagarto que a observava de cima de uma 'laje de pedra' próxima dali. -Ô uai...é só um 'largatinho', sô...vem cá pra eu te levar pra panela, bitelo, vem...ha ha ha! Ela brinca, mais aliviada, e assim torna a lavar suas roupas em seguida. Mas ao fazer isso, ela é surprendida pela mão negra de alguém que tampa a sua boca, a agarra e começa a buliná-la. Galega ainda tenta lutar e se desvencilhar, mas o misterioso indivíduo é mais forte, e após certo tempo se mantendo a cheirar e beijar o cangote daquela galega, ele debruça a mesma, colocando-a de cara contra o banco de areia daquele ribeirão, e em sua loucura arranca-lhe a longa saia de chita com os seus dentes afiados como os de indígenas de determinadas tribos africanas. E ali mesmo sob a luz da lua começa a sodomizar aquela pobre e aflita provinciana. O misterioso homem, se era mesmo 'um homem'...era bem forte, tinha um cheiro estranhíssimo parecido com 'enxofre' ou seja o que for...e para o maior suplício daquela campesina, a criatura era muito bem dotada, o que fazia 'esgaçar' suas brancas e avantajadas ancas jamais 'defloradas' devido ao rigor de sua religião. Ele emitia grunhidos e até uivos enquanto violava Galega que de quatro naquela beira de rio só podia mesmo era segurar bem forte alguns punhados daquela areia como se fosse uma 'fronha'. O pênis do bandido chegava a dobrar e quase 'quebrar' devido ao seu tamanho descomunal. E já numa outra posição, deitada de costas na areia com uma grande e forçada abertura de pernas, ninguém ouvia Galega gritar, e assim aquela violência durou toda noite. No dia seguinte, o marido, a polícia e vários populares estão envolta do corpo ou 'do que sobrou' de Galega. A mulher estirada naquele chão sob as lágrimas do marido e comentários de seus espantados vizinhos, era uma típica vítima de violência sexual fora estranhos detalhes como marcas de presas e até alguns sinais de canibalismo. Ela também fora estrangulada. A violência era absurda e inacreditável para aquela cidadezinha de interior nada acostumada com tal coisa. Nos comentários alguns populares diziam que aquilo era obra de um 'homem lagarto', uma estranha criatura metade homem, metade lagarto que rondava a região estraçalhando as galinhas, atacando o gado, 'vampirizando' o mesmo, roubando as casas e violentando as mulheres. Os policias não deram muita atenção para aquela suposta crendice. E assim o corpo é removido pelo rabecão, mas quando os PMs seguiam para a 'joaninha' ou viatura em forma de fusca da época, um deles se assusta com o que parecia ser a cauda de um imenso lagarto que saía detrás de uma moita. A mesma, logo desaprece, e este policial cismado, coça a cabeça sob sua boina, olha envolta, mas antes de concluir ou considerar qualquer coisa, é chamado e apressado pelo parceiro para entrar no fusca. Alguns dias se passam, mas o terror daquela 'roça' localizada naquela perdida cidadezinha da Zona da Mata mineira. Os bailes de forró e outros festejos populares típicos já deixavam de acontecer. Até mesmo coisas corriqueiras para aqueles sertanejos como catar lenha, pescarias e caçadas já não eram mais realizadas se não fossem em grupos ou até certo horário. O laudo da perícia que diria o que de fato vitimou Galega ainda nem havia saído, mas para aqueles campesinos, o autor daquilo já tinha nome e alcunha: 'Estrelinha, o Homem Lagarto'. A misteriosa criatura assassina que havia roubado o lugar de protagonistas de lendas ou 'causos' de quaresma mais assustadores como o lobisomem, sua irmã mula sem cabeça e outras assombrações. Alguns pescadores ou 'contadores de causos' mais virtuosos e fanfarrões, por aqueles 'botequins' de pau-a-pique já registraram e até 'juraram' ter visto Estrelinha que também tinha fama de zoófilo, a fazer sexo ou 'metendo' loucamente com a própria mula sem cabeça. Outros diziam que Estrelinha era fruto de uma relação ou 'cruzamento' sobrenatural entre um saci e uma freira. O tal saci 'arteiro' teria ejaculado nos fundilhos de uma 'calçola' ou calcinha clássica que a tal 'irmã' havia deixado para secar numa cerca de arame farpado, e quando a mesma vestira a peça, acabara engravidando do ente, e ao ser descoberto isso, o padre a excomungou, o que fez com que ela desse a luz a tal 'fruto maldito' bem no meio do mato onde o mesmo fora abandonado. Essas eram algumas das muitas lendas que cercavam aquele tão temido bandido ou 'ser'. Até que uma nova vítima já era espreitada pelo tal monstro. Ao seguir por um milharal após levar a comida ou o 'comer' de seu marido, uma jovem recém casada mal sabia o que lhe espreitava dentre todas aquelas 'bonecas de milho' a madurar. Ainda na forma humana, o negro Estrelinha com os seus 'olhos amarelos' já como se fossem 'de víbora', já se transformando, ao por sua terrível 'língua partida' de cobra para fora, este parecia lamber os beiços ao ver aquela tão jovem e linda tabaroa inocente. E já quase completando a sua transformação, num quadro ainda 'antropomorfo', ele surpreende a jovem com uma forte chibata com sua cauda que sai de dentro das plantações de milho laçando a mesma pela cintura, e a puxando daquela trilha para dentro do milharal e em plena luz do dia. E horas depois, o cenário é o mesmo do que acontecera com Galega, a lavadeira do ribeirão. O choque e o pavor de todos envolta também não foram diferente. Muitos se apavoravam e alguns até clamavam por justiça e se prontificavam a fazer alguma coisa à respeito. A polícia, descrente, chegava a suspeitar de alguns daqueles caboclos, mas todos insistiam que era obra da tal aberração, e cobravam mais atenção das autoridades ao caso. O laudo da morte de Galega finalmente sai e dentre outros resultados da violência, foi comprovado que a esganadura que a mulher sofrera fora provocada por algo similar a uma corda. E isso mexera ainda mais com a imaginação daquele povoado. A suposta 'corda', na verdade seria a cauda de Estrelinha que numa 'rabada' estrangulou aquela pobre mulher após toda a sodoma que ele lhe praticara. E numa outra noite, mais uma vítima foi feita. A também jovem e linda mulher de 'Craudão'. Este era um lavrador metido a ser o valentão do local, mas ao chegar em sua casa de pau-a-pique e se deparar com aquele negro imenso com aquela cauda de lagarto agitada se balançando enquanto fazia um guloso 'cunilíngua' em sua desesperada mulherzinha, ainda de camisolinha, mantida sentada 'na cacunda'(sobre seus ombros), este só tremia as pernas e implorava para que a criatura não lhe fizesse nada. E esta que não falava, apenas grunhia, ria e uivava, aponta para uma garrafa de cachaça que se encontrava sobre a mesa. Craudão tremendo 'feito vara verde', corre para pegar a bebida e assim que dá a mesma para Estrelinha, este deixa a mulher, gargalha toma um trago e ao cuspir a mesma, ou 'baforar' aos borrifos para o alto, numa explosão similar a de 'pólvora seca', ele completa a sua transformação em lagarto-estrela(Stellagama stellio) e que aos ligeiros rastejos foge dali. Num outro ataque, Estrelinha apavora um casal de namorados que resolvera fazer amor na mata. Neste ataque ao colocar a jovem de quatro sobre a esteira que os dois usavam, para humilhar tanto ela quanto o rapaz, o enlouquecido Estrelinha aplica 'surrinhas' com o seu imenso pênis sobre as ancas da mesma e antes de entochar aquela coisa cheia de veias naquele tão estreito orifício, fitando o também aflito e inerte namorado, o bandido sopra sua língua entre os lábios e reproduz assim uma onomatopeia que simulava um 'peido'. Em sua doentia excitação, ele além de ter devorado a sainha rodadinha e de cor laranja daquela jovem, também fazia 'caras e bocas' e pronunciava estranhos 'balbucios' ou palavras que pareciam ser no 'idioma nagô' ou em alguma outra língua africana perdida. Sua longa cauda de lagarto que já surgia e se mantinha irriquieta, também fora usada para sodomizar ou constranger como fosse aquela cabrocha. Em outros dois ataques Estrelinha desaparecera com a mulher de um fazendeiro e uma 'professorinha leiga' vinda da cidade para lecionar para crianças e adultos de uma escolinha improvisada naquele rincão. Neste dois casos tido como os mais escabrosos e macabros, haviam boatos de que essas duas foram canibalizadas pelo monstro. Mas já numa última aparição, a criatura é apenas avistada por um menino que vai pegar sua bola de meia que caira num bambuzal onde Estrelinha em sua foram humana se masturbava loucamente com uma calcinha enrolada em seu longo pênis ereto. O garoto se espanta e corre para chamar seu pai que ao chegar ali com sua espingarda, vê apenas aquela calcinha rosa-shocking puída e empapada de sêmen e algo que parecia ser um rabo de lagarto a se enfiar pelas moitas de bambu. Ele chega a atirar, mas em vão. Estrelinha na forma de lagarto-estrela já havia sumido. Já estupefatos com os ataques daquela aberração e com o descaso e descrença das autoridades do centro da cidade. Todos aqueles simples homens e mulheres do campo resolvem sair munidos de suas foices, ancinhos e tochas atrás da famigerada criatura. Apesar de muitos acreditarem que o mesmo vivia embaixo da terra, era sabido por alguns daqueles populares que Estrelinha tinha um outro possível esconderijo. Mas tal lugar por ser situado num ponto mais afastado daquele rincão e por ser próximo à uma figueira, também a crendice popular fazia-lhes acreditar que aquele local era amaldiçoado ou assombrado, e logo ninguém se atrevia a se aproximar daquela casa de pau-a-pique. E com isso, Estrelinha viu naquele lugar o local perfeito para seu refúgio, hibernação ou 'troca de pele'. Mas para aquelas pessoas, o momento era crítico, o reinado de terror daquele monstro tinha que parar o quanto antes. Os lagartos comuns que faziam parte do 'cardápio' de iguarias locais, junto com certos tipos de lagartixas, começavam a serem temidos também. E além das vítimas que Estrelinha fazia, outros campônios já deixavam de trabalhar nas lavouras ou mesmo já abandonavam aquela roça de vez com medo desse terrível demônio assassino. E pensando assim, com uma garrucha, zagaias, suas ferramentas de lavradio como armas, água benta e até mesmo um benzedor local, ao cair da noite, aquela população com sede de justiça ou vingança seguiu até a casa da figueira. E ao passarem por aquela torta e apodrecida porteira, a trilha dentre todo aquele alto 'capim-navalha' que dava até o casebre era tão aterradora quanto toda aquela situação. Carcaças de animais massacrados, rastros de sangue, trapos de roupas e calcinhas de possíveis vítimas, travessas de barro e cruzes que evidenciavam algum tipo de ritual macabro feito pelo monstro e até uma 'pele' deixada por ele é encontrada sem querer quando uma das mulheres que acompanhava o grupo, se desespera ao sentir o seu pé se enroscar na mesma. E ao chegarem lá, gritos, xingamentos e orações em voz alta eram proferidos, além de pedras que eram atiradas por eles contra o casebre. E Estrelinha que se encontrava dormindo, logo desperta com a confusão. O mesmo tenta fugir, mas o teto da casa coberto por palha, começa a se incendiar com uma tocha que fora ali arremessada. E não demora aquelas chamas tomavam toda a palhoça, e com isso Estrelinha sai dali com o o corpo todo em chamas correndo em meio a multidão que ainda lhe acerta algumas pauladas que fazem com que ele corra para mais pra dentro daquela mata onde assim desaparece. Seria o fim de seu reinado de terror. E dias depois, é dado um forró no sítio de um agricultor que convida quase todo o povoado para participar. Um leitão é preparado, além de papa de milho e até mesmo fogos em comemoração pela morte da criatura que tanto os apavorava, são soltos. A festança e todo o seu 'rastapé' se dá até a madrugada. E quando finalmente tudo chega ao fim, todos aqueles lavradores e lavadeiras que precisavam acordar bem cedo no dia seguinte, seguem por aquela estrada de chão batido até suas humildes casas. Muitos 'trocavam suas pernas' de tão bêbados, outros se mantinham apenas alegres. Um comentava sobre o festejo, a comida e a dança e já outros falavam e se gabavam sobre como o temível Estrelinha fora morto pela população. As mulheres do grupo, sempre as mais frágeis, e logo, temerosas, pediam para que os homens mudassem de assunto e esquecessem daquele monstro. A noite daquele dia não tinha lua e isso fazia com que aquele caminho iluminado por uma única lanterna que um dos homens portava, ficasse uma verdadeira penumbra ou 'breu'. E é quando aquele falatório e risadas são interrompidos por uma das moitas que circundavam aquele caminho, que começava a se mexer. Todos ficam logo apreensivos, e a lanterna é logo apontada para tal moita que insistia em se mexer. Alguns daqueles homens já tiravam suas faquinhas e canivetes de seus alforjes e coldres e a única espingarda com o grupo já era engatilhada naquela direção. Mas quando menos se espera do lado oposto daquela moita, eis que surge Estrelinha na sua forma mais horripilante, ou seja, metade homem, metade lagarto. E por mais inacreditável que fosse, apesar das graves queimaduras que a criatura sofrera seu corpo parecia intacto. Sua forte pele escamosa de lagarto talvez devesse ser imune a queimaduras. Estrelinha estava novo em folha e parecia ainda mais sedento de sangue. Horas antes durante o forró, algumas crianças chegaram assustadas dizendo para os seus pais que haviam avistado uma grande cauda de lagarto enquanto brincavam próximos a uma moita daquele sítio. Mas julgando o quanto pode ser prodigiosa a mente dos pequeninos, nenhum adulto dera ouvidos aos mesmos. E assim, Estrelinha já corta a jugular do homem que ele surpreende por trás, estrangula com o rabo um outro e quando Estrelinha vai para frente do grupo, o homem com a espingarda desfere vários tiros em sua direção dos quais a incrível criatura consegue desviar com rápidos movimentos parecidos com os de 'capoeira'. E com todo esse drible ele que também mudava a coloração de sua pele ou escamas, consegue tomar a espingarda do homem, quebrá-la e avançar naquela multidão apavorada. Uma das mulheres é pega e arrastada para a atrás de uma daquelas moitas, e as que conseguem fugir, o fazem gritando e berrando enquanto são puxadas pelas mãos por seus também aflitos maridos. O tempo passa, os ataques dão uma certa trégua, mas isso não evita que muitos daqueles campônios abandonem suas casas, independente de terem bons patrões ou serem nascidos e criados ali. O pavor era bem mais forte que tudo isso. E nisso, um PM reformado e cansado das agitações da cidade acaba comprando uma daquelas casas abandonadas. Seu nome era Candinho e no batalhão em que servia, nos tempos de ativa era conhecido por sua bravura. Ele se muda para a antiga casa de um criador de gado que fugiu dali após perder boa parte de sua criação vampirizada por Estrelinha. Na cidade onde Candinho vivia, que não era muito distante dali, ele chegou a ouvir alguns boatos ou comentários sobre o tal 'homem lagarto'. Mas levando tudo na brincadeira enquanto tomava uma 'branquinha' ou cachaça naquele botequinho de pau-a-pique próximo a casa que ele acabara de comprar naquele arraial, ele dizia para aqueles lavradores que 'até mesmo as assombrações tinham medo dele e de seus companheiros de farda quando estes saíam para fazer a ronda na cidade onde ele morava'. E mais outro ataque acontece, e dessa vez numa casa próxima a casa de Candinho. Mas neste ataque, por sorte, Estrelinha em sua forma antropomorfa, não consumou qualquer ato que fosse. Nesta casa onde morava apenas uma mulher com um casal de filhos, o monstro apenas comeu todo o angu que se encontrava numa panela, e em seguida só se aproximou daquela mulher que se mantinha abraçada aos filhos sentada na cama, e numa cena bem parecida com aquela cena clássica do filme 'Alien 3' no qual a criatura também 'flerta' com a Tenente Ripley, se aproximando  bem da face da mesma, Estrelinha reproduz o gesto na mesma forma pondo sua língua de lagarto para fora; mas assim que o galo canta anunciando o nascer do dia, o antropomorfo naquela explosão de 'pólvora seca' se transforma naquele rasteiro lagarto-estrela e foge em disparada dali. E mais tarde, quando Candinho tem conhecimento do fato, e constata que aquilo não se tratava de uma lenda local como sua descrença o fazia acreditar, este logo se prepara para também ficar no encalço da criatura. E assim, sobre seu cavalo, munido de uma lanterna e com o seu inseparável revolver 38, Candinho começa a fazer rondas noturnas. Nas primeiras, ele nada encontra. Era como se o monstro 'o farejasse'. Até que naquela noite de lua cheia ao se aproximar daquela encruzilhada, Candinho finalmente avista a coisa metade homem, metade lagarto a estraçalhar uma galinha viva. Seu cavalo é o primeiro a se assustar emitindo um alto relincho, se empinando e quase derrubando Candinho. E este ainda incrédulo, joga a luz da lanterna na cara de Estrelinha. -Nossa Senhora! É o que ele consegue dizer com o susto que tomara. E Estrelinha que nesta hora, além de mudar a coloração de suas escamas, também 'se inflava', aumentando sua estatura, porém também se espanta, e assim foge como um animal arisco ignorando os chamados de Candinho. E naquela louca perseguição Candinho atirava de seu cavalo enquanto na frente Estrelinha em sua forma antropomorfa seguia correndo ou se arrastando como um lagarto gigante. Até que um dos tiros o acerta. Estrelinha atordoado chega a perder a sua cauda que prontamente é substituída por outra, mas logo para. Candinho em seguida desce de seu cavalo e já próximo de Estrelinha desfere vários tiros à queima roupa, descarrega a munição de seu revolver atingindo dentre a cabeça outras partes vitais do homem lagarto, inclusive seu pênis com o qual ele violou e sodomizou todas aquelas jovens tabaroas antes de matá-las. Mas inacreditavelmente, Estrelinha não morria. E foi quando ainda moribundo enquanto Candinho totalmente pasmado e descrente daquela situação, pegava mais balas de seu alforje, Estrelinha que até então quase nunca falava, apenas ria, grunhia ou uivava em seus ataques, suplica pedindo 'para que este retirasse de seu bolso um livreto que continha uma poderosa reza que o impedia de morrer'. E ao ouvir isso, Candinho pega o tal livreto, e assim ao voltar a sua forma humana, finalmente o terrível homem lagarto assassino morre. Candinho ainda tem a frieza de com sua bota cutucar e virar aquele corpo. E o que ele via com o auxílio de sua lanterna era algo inacreditável. Apesar de estar em sua forma humana, aquele bandido ou criatura ao mesmo tempo em que se parecia com um homem negro, assim como o próprio Candinho, a pele da criatura era grossa e não parecia pele, mas sim escamas que possuíam manchas que lembravam uma 'certa doença de pele', mas na verdade eram manchas próprias da espécie de lagarto na qual aquele homem terrível se transformava. Seus dentes como já relatado, eram afiados, e suas orelhas eram mutiladas, talvez por ele próprio e como parte de mais um de seus rituais macabros. E com isso, a paz voltava a reinar naquele rincão do qual Candinho se tornara o herói. O caso é levado às autoridades que além do corpo de Estrelinha também recolhem o tal misterioso livreto. Das poucas páginas daquele livro que Candinho rapidamente folheou, ele também se assustou com a quantidade de imagens e ilustrações das mais profanas, macabras e até pornográficas nas quais se incluíam imagens absurdas e assombrosas de relações entre pavorosos 'gárgulas' e mulheres humanas, além de algumas 'rezas', conjurações e evocações malígnas e arrepiantes. O tal livreto na mão de alguns policiais acaba se tornando motivo de galhofa. E um deles, um jovem policial bem descrente, resolve até mesmo brincar lendo ou recitando algumas daquelas 'conjurações bizarras'. Seus colegas riem e outros até se mantem receosos o advertindo para que o mesmo não brincasse com tal coisa. Mas ele não dá ouvidos e faz a sua gracinha do mesmo jeito. Mas dias depois, este mesmo policialzinho começa a agir de forma estranha. Sua esposa estranhou o seu estranho e novo cacoete de ficar botando a língua a todo o momento para fora, além da vontade do mesmo de querer comer carne crua. E ele também se torna bastante violento inclusive na hora que os dois fazem amor. Além de violento, também experimenta formas de sexo que a mulher se desagrada, e quando a mesma o repele, ele acaba a estrangulando. E fazendo isso ele esconde o corpo dela e vai para a delegacia onde ao tirar serviço numa diligência também estrangula o parceiro sem qualquer explicação. Os outros tentam separá-lo, mas a sua força era algo descomunal e foi preciso simplesmente 'fuzilá-lo' para que ele soltasse o colega quase à morte. O que se concluiu fora que o jovem policial estava passando por stress de trabalho, mas por outro lado, muitos sabem e viram ele brincar com aquele tal livreto que se encontrava no almoxarifado da guarnição. Candinho que muitos diziam possuir o couro de Estrelinha pendurado na parede de sua sala, e que apenas visualizou rapidamente algumas páginas e figuras daquele livro, também começara a agir de forma estranha. O mesmo começou a se manter calado, solitário e a ter hábitos estranhos e inexplicáveis. Até que veio a notícia de que estranhamente, ele apontara o seu 38 contra a própria cabeça e se matara sem nenhuma explicação plausível para tal ato. Anos depois aquela delegacia acabou sendo desativada, e com isso as coisas que ali ficava retidas, também tiveram fim ignorado, inclusive o tal 'livreto do mal'. Também nunca se soube onde fora enterrado ou 'desovado' o corpo de Estrelinha. A população sabe de seu fim, mas nunca viu o seu corpo e só ficaram mesmo fora com as histórias de Candinho que por ser ex-policial lhes inspirava muita confiança e segurança. Em cidadezinhas vizinhas já começavam a surgir boatos de supostas novas aparições da criatura, e também se dizia que muitas daquelas mulheres que sobreviveram ao seu ataque, ficaram grávidas e que ao fugirem daquele lugarejo se espalharam por várias capitais, onde com o passar do tempo o aumento do índice de crimes brutais e inexplicáveis coincidiu com o tempo em que essas crianças atingiram certa idade. Tudo isso com exceção de alguns acontecimentos e alterações de alguns locais e nomes de personagens, de fato aconteceu há cerca de trinta anos atrás numa pequena cidade do interior do estado do Rio de Janeiro. Pouco se sabe sobre o que é lenda ou o que é real, mas...e o tal livreto? Este que dentre outras coisas bizarras também ensinava encantamentos para transformar um ser humano, além de lagarto, em lagartixa, ratos e até num mosquito...?! Ninguém sabe o seu real paradeiro. E pode está por aí nas mãos de algum assassino em potencial ou alguém que passe a ser um após folhear aquelas páginas macabras e se tornar autor da mais hedionda e infame atrocidade que se possa imaginar, mas nunca explicar.

Enviado por: Dr. Honoris causa

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Caso Muriel Santos

 Durante alguns meses, eu trabalhei num hotel perto de casa. Nessa época, era a minha única opção. Se eu pudesse voltar no tempo, eu procuraria outro emprego. Aquela foi a pior escolha da minha vida.
 Tudo começou no primeiro dia de trabalho naquele lugar horrível, quando eu estava limpando o balcão e um hóspede chega. Era uma mulher linda, simpática e perfumada. Ela alugou um quarto no último andar do hotel.
 Alguns minutos depois, chega um homem estranho com um olhar meio desconfiado, como se estivesse fugindo de alguma coisa. Ele ficou sentado no saguão por quase uma hora, e depois subiu as escadas pro segundo andar. Eu tentei seguir ele, mas fui chamado na recepção.
Eram 2:00 da manhã quando meu turno acabou. Peguei meu carro e fui pra casa. Chegando lá, liguei a tv e fui lanchar.
A única coisa que dava pra assistir era um canal de notícias falando sobre uma tal de Muriel Santos que tinha sido encontrada morta no hotel que eu trabalhava. Nesse momento o meu sangue gelou e eu quase desmaiei ao ver que era a mesma mulher que eu tinha deixado no freezer do hotel. Mas eu lembro de ter cortado muito bem o corpo dela em pedaços. Ninguém usa aquele freezer desde que eu trabalho naquela merda. Como descobriram aquele corpo lá? Será que viram também os corpos que estavam na caixa d'água?