quinta-feira, 11 de setembro de 2014

O Amigo Virtual

Um relógio de aspecto antigo na parede avisava que era tarde. Duas horas e quarenta e cinco da madrugada, porém era costume ficar acordada até altas horas. Sem se importar com as voltas que o relógio dava ferozmente Juliana teclava sem parar.
 Numa sexta-feira à noite a garota de dezessete não havia saído para se divertir com amigos num bar qualquer decorado no clima de halloween, com bebidas de aspecto duvidosas fumegando e docinhos com cara de sapo ou em formato de dedos de bruxas, nada mais justo que ficar online para se distrair da frustração de que até seus pais haviam saído e ela ali estava, sozinha.
 O silêncio deixava o ambiente morto enquanto Juliana terminava de eliminar a quinta xícara de café. Ora ou outra as crianças faziam um barulho na rua, fantasiados em busca de doces. A noite das bruxas de Juliana estava saindo pior que a encomenda.
 O cheiro de cigarro invadia o quarto deixando aquele cheiro forte nas cortinas e nas bonecas que observavam a jovem de perto.
 Os dedos de Juliana batiam em cada tecla numa velocidade absurda, parecia não notar o que fazia, apenas teclava sem parar. Como uma obsessão conversava com varias pessoas ao mesmo tempo.Ainda olhando para a tela do computador acendeu mais um cigarro, passou as mãos no rosto numa expressão de estresse e continuou a teclar, parou novamente franzindo a testa numa expressão intrigada e divertida ao mesmo tempo. Havia recebido uma mensagem estranha no chat:
 - Você tem medo de morrer?
Era uma das pessoas que Juliana mais gostava de conversar, uma amiga que morava em outra cidade e com a mesma idade que a sua. Nunca havia conhecido-a pessoalmente, mas Juliana confiava mais nesta amiga virtual que nas amigas do colégio. Animando a brincadeira respondeu que não à pergunta.
-Será muito divertido se você vier para o lado de cá, comigo. Podemos nos divertir muito!
Juliana não entendeu , mas confirmou que seria muito divertido. Mais uma vez a garota do outro lado perguntou:
 -Eu posso te buscar para ficar aqui comigo?
A conversa estava estranha, a amiga estava estranha, porém Juliana respondeu que ela poderia busca-la quando quisesse. As palavras se formavam na tela do computador:
 -Você está preparada para passar para o lado e cá? Apenas confirme e vou lhe buscar!
Mais uma vez Juliana confirmou. Mas intrigada sobre qual lado sua amiga estava se referindo. Recebeu rapidamente uma resposta sarcástica:
 - Você disse que não tinha medo de morrer! Agora já estou chegando...
Juliana mal teve tempo de digitar uma resposta, quando gritou assustada com batidas fortes na porta de sua casa. Olhou no relógio de relance e notou que eram três horas em ponto. Não era uma hora que agradava muito, dias antes ouvira falar que era a hora oposta em que Jesus Cristo foi crucificado. A hora em que o lado sombrio ganha força. Desceu as escadas e com cautela olhou pelo olho mágico da porta e viu uma garota de costas, reconheceu os cabelos, realmente era sua amiga virtual. Ela havia ido mesmo visita-la, será que estava na cidade e não avisara? Abriu a porta com um sorriso escancarado e chamou sua amiga num tom divertido.
 Num segundo sua amiga virou-se e no lugar do habitual sorriso estava estampado uma face horripilante, como se o rosto da garota estivesse em decomposição, pedaços de pele se despregavam e no lugar dos olhos havia dois fundos buracos. A boca estava torta e faltavam alguns pedaços.
 Instantaneamente Juliana bateu a porta novamente antes que aquela criatura se aproximasse, trancou dando duas voltas respirando mais rápido que as batidas do seu coração. A criatura batia na porta querendo entrar enquanto as luzes da sala antiga começavam a piscar com veemência.
 Um cheiro podre invadia o cômodo enquanto o silêncio retornava sem avisos. Juliana se aproximava do telefone quando notou a presença de alguém no interior da sala. O cheiro podre exalava mais forte. Tremendo de medo a garota virou-se devagar e gritou desesperada quando viu o cadáver. Com os cabelos embaraçados e lodosos, e a silhueta deformada recortada contra a luz que vinha da janela.
 Aquele ser se aproximava lentamente de um modo ameaçador. Então a escuridão chegou... A última coisa que Juliana pôde ver naquela noite de bruxas foi aquele rosto monstruoso a um palmo do seu próprio rosto enquanto seus gritos ecoavam pela casa.

Nunca sabemos quem realmente está do outro lado. Você tem medo de morrer?


Enviado poAnt Lima.

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